Abaixo-Assinado (#4914):
O escritor e perseguido político Cesare Battisti ainda está preso no Brasil, ao arrepio da Lei e da jurisprudência, embora já em janeiro/2009 devesse ter sido libertado em função do reconhecimento de sua condição de refugiado político por parte do governo brasileiro. E a Italia continua movendo céus e terras para impor sua extradição, numa campanha que mobiliza recursos astronômicos e utiliza pressões as mais descabidas para vergar as autoridades brasileiras a seus desígnios.
Pedimos aos cidadãos com espírito de justiça, no Brasil e no mundo, que assinem e divulguem este abaixo-assinado para a libertação de Cesare Battisti.
LIBERDADE PARA BATTISTI
Sr. Presidente da República Federativa do Brasil,
Sr. Presidente do Supremo Tribunal,
Sr. Ministro da Justiça,
nós, abaixo-assinados, pedimos-lhes solenemente que não extraditem Cesare Battisti, que lhe ofereçam o refúgio político humanitário e que lhe permitam viver no seu país, como ele disse desejar.
A decisão tomada pelo ministro da Justiça em 23/01/2009, de atribuir-lhe o refúgio político humanitário, honra o seu país e o povo brasileiro. Honra todo o Brasil, não somente pelo seu alcance individual, mas, sobretudo, pelo seu alcance universal -- até porque, como sublinhou a ONU, existe um real perigo de que se esvazie a instituição do refúgio.
Apesar desta decisão soberana, a Itália continua fazer pressão sobre o vosso governo para exigir a extradição de Cesare Battisti. Frente a essa pressão reiterada, sem considerar o conjunto do processo agora conhecido, desejamos retomar alguns elementos que devem permitir compreender-se que, além do caso Cesare Battisti (que não é unico), é da defesa das liberdades democráticas que se trata.
Não é o caso de discutir o carácter democrático ou não da Itália.É indispensável recordar que este país foi objeto de numerosas denúncias por parte do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos e de organizações reconhecidas em nível internacional, relativas à tortura, bem como à implicação dos diferentes serviços policiais e judiciais em casos de suspensão e desrespeito das regras do Direito internacional em matéria de direitos humanos.
Desde 1979, os relatórios da Anistia International referem alegações de tortura ou de tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, tanto nas detenções como em prisão preventiva, além da prestação de cuidados médicos insuficientes aos detidos.
Até hoje, no seu último relatório de 2009, a Anistia Internacional destaca: as autoridades italianas ainda não inscreveram a tortura entre os crimes sancionados pelo Código Penal. Também não instauraram mecanismo eficaz que assegure que a polícia preste conta dos seus atos.
Os anos de chumbo, na Itália, inscrevem-se num contexto internacional em que, do México à França, passando pela Checoslováquia, milhões de pessoas manifestam contra o autoritarismo e procuram construir um mundo ideal de liberdade e de justiça.
A América Latina pagará muito caro esta sede de liberdade. Os sucessivos golpes de estado fomentados pelos Estados Unidos para extirpar os movimentos que prejudicavam os seus interesses seriam apoiados pelos países da Otan, e a França. Estratégia do terror, tortura, desaparecimentos e eliminação sistemática dos oponentes foram então erigidos em método de governo. A Europa não escapou a este processo; e a Itália, sem dúvida, menos ainda que os outros países.
Aí está porque é necessário recordarmos que, precisamente, estas estratégias de tensão e terror, bem como os riscos de golpe de estado fascista, tomaram corpo naquele país, como testemunham os atentados e massacres perpetrados pelo grupo Loja P2, os circulos fascistas e os serviços de informação italianos.
Piazza Fontana (1969 - 17 mortos, 88 feridos), Brescia (1974 - 8 mortos, 94 feridos), Bolonha (1980 - 85 mortos, 200 feridos) são os atentados mais notáveis desse período, mas estão longe de ser os únicos.
No decreto de novembro de 1995, O tribunal supremo italiano revelou a existencia de uma vasta associacão subversiva composta, de uma parte por elementos provenientes de movimentos neo-facistas dissolvidos, como Paolo Signorelli, Massimiliano Fachini, Stefano Delle Chiaie, Adriano Tilgher, Maurizio Giorgi e Marco Ballan; e, por outra parte, Licio Gelli (chefe do grupo Loja P2), Francesco Pazienza, o colaborador do diretor geral do serviço de informação militar SISMI, e dois outros oficiais do serviço a saber, o general Pietro Musumeci e o coronel Giuseppe Belmont.
É nesse contexto que mais de 400 organizacões estruturaram-se para lutar contra o fascismo; e que dezenas de milhares de italianos foram às ruas e atacaram tais milícias. Milhares de opositores do fascismo foram condenados a séculos de prisão.
Sustentar-se hoje que estas condenações não se inscreveram num contexto político e que foram decretadas apenas contra qualquer malfeitor sem fé nem lei, revela simplesmente uma negação da realidade. Ou, mais precisamente, um disfarce da História, que serve para ocultar as razões pelas quais, ainda hoje, o risco fascista persiste na Itália.
A recaída no fascismo ameaça a Europa democrática desde a primeira eleição de Silvio Berlusconi em 1994. Este aliou-se a um partido abertamente xenófobo e federalista, a Liga do Norte; e, na Aliança Nacional , retomou o chefe do MSI Giorgio Almirante (chefe de gabinete de ministro da Cultura popular de Mussolini e membro da guarda nacional da República de Salò). A página mussolineana está longe de ser página virada .
As últimas leis votadas pela Itália são também objeto de preocupações crescentes entre os organismos internacionais de defesa dos direitos humanos, devido ao seu carácter racista e xenófobo, bem como ao descumprimento de suas obrigações internacionais (vide o relatório da Anistia Internacional de 2009 e os comunicados de imprensa de 07.05.09 e 03.07.09, dentre outros).
Numerosas são as acusações de maus tratos, tortura e violação da dignidade humana que continuam a pesar sobre o sistema carcerario italiano. Ainda em julho de 2009 a Itália voltou a ser condenada pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos pelas condições de detenção julgadas degradantes.
Nessas condições, é evidente que a extradição de Cesare Battisti e sua condução às prisões italianas colocariam em efetivo perigo a sua integridade física e psicologica. Os fatos pelos quais Cesare Battisti foi condenado situam-se claramente num contexto político e a obstinação vingativa da qual é objeto revela-se igualmente politica. É por isso que, seguindo a decisão do Ministro da justiça, rogamos-lhe liberar Cesare Battisti e garantir-lhe o refúgio político humanitário político que lhe foi outorgado em janeiro de 2009. O seu país faz, doravante, parte de um continente no qual a esperança renasce. São nações que, afirmando a sua independência, libertaram-se das tutelas estrangeiras. Estamos convencidos que vocês não voltarão ao passado, extraditando Cesare Battisti, o que seria uma reincidência na terrível decisão do governo que entregou Olga Benario, companheira de Luiz Carlos Prestes, à Alemanha nazista. Estamos certos que reafirmarão a independência do seu país e sua adesão aos ideais de liberdade e de justiça.
Cremos que colocarão Cesare Battisti em liberdade.
Em: agosto/2009
Comitê de Solidariedade a Cesare Battisti
battistilibre@yahoo.
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